segunda-feira, junho 18, 2007

Superficial



No ETV me deparei com um doc belíssimo chamado Tarachime. A Anita Rocha tinha me dado o toque que era imperdível e tal, e então dei uma semi-conectada ao que algumas pessoas já tinham me falado de um tal de Shara. O filme é lindíssimo, de uma força espantosa, de uma coragem e precisão muita profundas - como escrevi no texto pro DocBlog que está aqui num post mais antigo.

Tenho baixado muitas coisas. E ficado um pouco culpado por não assistí-las. Sábado decidi tirar um pouco o atraso. Assisti o Embracing, o primeiro filme da miss Kawase, e Suzaku, primeiro longa de ficção, ganhador da Câmera do Ouro em Cannes 97. Meu deus. A mulherada tá demais mesmo. Kawase parece que já nasceu sabendo. Embracing já tem um raciocínio fantástico sobre imagem, perda e experiência. Muitíssimo Mekas, talvez a coisa mais parecida com o lituano que eu já vi, porém aqui o trauma é outro, e há a busca, uma meta. Ela corre atrás da lacuna de maneira direta. O verbo é ruim, mas de alguma forma ela quer resolver: quer encontrar seu pai verdadeiro. É um filme que necessita revisão urgente. O final é de tirar o fôlego. O jogo do nome é interessantíssimo porque "abraçar" é tudo o que os japoneses não fazem, o abraço está no extra-campo da vida deles. A cena da despedida no Suzaku tem um peso profundo, uma atmosfera crítica e densa muito por causa do abraço que não se dá. A questão da contenção me pega de jeito mesmo.

Suzaku é um filme maduro. Com uma certeza de vida e de cinema muito profunda e delicada, uma espécie de grossa raiz aérea. Junta muita coisa boa, me lembra coisas que gosto muitísisimo: Kitano pela música, por alguns tempos e ternuras, especialmente aquele road movie feliz de que gosto mas esqueci o nome agora, Hou Hsiao-Hsien pelo quadros, pela fluência e simultaneidade, Jia Zhang-Ke por motvos parecidos, pelas panorâmicas e outros que agora não me lembro.

Mas o que mais me chama atenção e arrisco a identificar uma característica "japonesa" nos cineastas nipônicos que tenho tido mais contato, principalmente Suzuki, a questão do espaço, do fora. Cinema e arquitetura mesmo. Isso é um assunto pra muitos posts, e acho que o Rossellini me parece muito importante nisso: o cinema não tem necessidade da interioridade, da personalidade do que se chama de "dentro", a identidade, que se supõe "dentro" não é um valor tão grande assim, e me ela parece uma falsa questão. O fora é profundamente potente, e é o domínio do cinema por excelência. Olhar é conhecer. E, se sentir falta do conceito, o fora tem interioridade também, tem espessura. O fora tem fora também , o extra-campo. Um brinde à exterioridade, à força da superfície. Obrigado, Naomi.

sábado, junho 02, 2007

Íris aberta




Olá.

Não tenho conseguido postar coisas aqui com assiduidade. Nâo tenho conseguido me organizar para tal, mesmo tendo assumido pra mim mesmo este espaço como como lugar pra textos que nascem muito na hora, no ato, que se formam a partir do vai saindo. Mas fico um pouco decepcionado por isto. Tenho pensado muito em escrever sobre música. Estou me devendo isto.

Mas agora me deparei com um negócio que pra mim é super interessante, e um pouco constrangedor. No meu computador existem algumas anotações que faço, um pouco aleatórios sobre coisas que tenho vontade de fazer, principalmente me filme. Tenho pensado muitas coisas na rua prum próximo filme com atores, roteiro, e aquilo tudo - torço para que "aquilo tudo" seja constituído por cada vez menos pessoas. Pensei há 10 minutos: vou aproveitar que estou aqui um pouco de bobeira e escrever as pequenas idéias que tenho tido sobre este próxio filme. Abri um arquivo chamado "anotações sobre próximo filme" ("sobre " me parece uma palavra essencial aí). Foi muito interessante ler. Não compreendo bem algumas coisas. Talvez seja legal para outros também. Aí vai:

  • "história com personagens mulheres
  • a passagem do atravessar a rua, o olhar e a morte
  • a questão do toque, da vontade de tocar, da dificuldade de tocar, do mundo que existe e pesa na ponta dos dedos na hora do toque
  • a memória coletiva, impessoal
  • o espaço
  • os espaços
  • mostrar o essencial, mas não o mais importante
  • o que é o mais importante?
  • não mostrá-lo, sugerí-lo
  • ele cabe na imagem?
  • filme é importante?
  • a importância dos instrumentos, dos meios
  • filme e transportes (iguais? equivalentes?)
  • o confessional (figures)
  • a presença, qual a importância dela ou da falta dela (cinema) (será?)
  • o espaço vazio
  • o espaço onde deveria estar algo
  • o vazio-lacuna, o vazio-ausência
  • os objetos lisos, os metais, os vidros, as trasparências
  • os caminhos e as vias (liang)
  • os meios de interação
  • a percepção dos fragmentos
  • “o que eu deveria”
  • a 1a pessoa
  • o que não fiz
  • Nâo Fiz
  • e o que a memória diz sobre isso, sobre o que não fiz? sobre o que já está perdido
  • voz que fala é a de quem fez esse filme. como se a memória fosse um filme, uma organização de fragmentos que tem uma relação íntima entre si e com essa pessoa que fala
  • o cheiro, o nariz cheirando
  • imagens-sentido
  • imagens-experiência
  • fragmentação tornando o lugar comum abstrato
  • passeio no bosque
  • banho de rio
  • cheiro de chuva
  • o vento
  • o vento"
Ai, que vergonha. Mas, sei lá, de repente sirva pra alguém, até como comédia. A questão do "sobre" é um pouco como as coisas servem como ferramentas pra se dizer o que se quer. Talvez a velha discussão "forma e conteúdo". Talvez. Porque isso que escrevi aí em cima é sobre, em cima de nada. Não há roteiro, ou a mínima ação esboçada. Muitas das coisas aí já estão descartadas pra um filme que tenho imaginado mais ultimamente. Mas acho curioso enquanto começo, centelha. Tenho muito interesse em saber como é esse processo pras outras pessoas. Até pra essa pessoa que escreveu essas anotações há uns meses atrás.