terça-feira, fevereiro 19, 2008

De uma carta

Eu já escrevi esse post algumas vezes. Escrevi sobre Tiradentes, escrevi sobre as peças que vi semana passada, sobre o filme dos Coen, sobre "Sábado à Noite". Entretanto, ontem estourou uma bomba um pouco antes d'eu ir dormir. Peguei no banheiro da minha mãe um livro chamado Encontro Marcado, de Fernando Sabino - de quem eu nunca li nada mas tenho extrema simpatia, indireta, por conta da relação dele com a Clarice Lispector, e em proporção muito menor, por eu achar que ele era também capixaba como eu, o que não é verdade. Abri o livro e me deparei com o seguinte texto que quero deixar pra abrir o ano neste blog, com desejos de que seja um ano fértil neste cantinho virtual. Foi um baque ontem pra mim me deparar com este trecho. Aí vai o epígrafe de Encontro Marcado (1956):

"
O homem, quando jovem, é só, apesar de suas múltiplas experiências. Ele pretende, nessa época, conformar a realidade com suas mãos, servindo-se dela, pois acredita que, ganhando o mundo, conseguirá ganhar a si próprio. Acontece, entretanto, que nascemos para o encontro com o outro, e não o seu domínio. Encontrá-lo é perdê-lo, é contemplá-lo em sua liberrérima existência, é respeitá-lo e amá-lo na sua total e gratuita inutilidade. O começo da sabedoria consiste em perceber que temos e teremos as mãos vazias, na medida em que tenhamos ganho ou pretendamos ganhar o mundo. Neste momento, a solidão nos atravessa como um dardo. É meio-dia em nossa vida, e a face do outro nos contempla como um enigma. Feliz daquele que, ao meio-dia, se percebe em plena treva, pobre e nu. Este é o preço do encontro, do possível encontro com o outro. A construção de tal possibilidade passa a ser, desde então, o trabalho do homem que merece seu nome"

(De uma carta de Hélio Pellegrino)


Um comentário:

JBL disse...

obrigado, amigo.
me sinto pobre e nu no sol de meio dia... perceber que temos e teremos as mãos vazias realmente dói, mas nos faz sentir mais vivos. escrevo um domingo ensolarado de dentro do meu quarto. procuro uma janela, mas o sol não bate. sinto o cheiro da humedade e o bafo de uma tarde carioca, agente reinventa a nossa memória quando estamos longe e acredita que a vida é mesmo um vaco no tempo.