sábado, outubro 17, 2009

Mekas 1


The Brig
de Jonas Mekas
68´ EUA 1964

The Brig precede o transformação dos rolos cotidianos de bolex 16mm em filme e sucede o primeiro longa de Mekas, Guns of the Trees. E seu filme que tem o prêmio mais importante até hoje, melhor documentário em Veneza em 1964.
Trata-se da transformação em filme de uma encenação do Living Theatre feita numa locação, num espaço real, fora de um palco. Durante sessenta minutos, o filme se desenvolve numa sala quadrada com uma grande grade central, onde ficam os prisioneiros, com uma porta em cada lado desta grade. A câmera se move por dentro da grade e pelo corredor que a circunda pela frente e pelas laterais. A peça mostra um dia, marcado por cartelas com as horas e que dividem os segmentos, nesta prisão onde fuzileiros navais americanos humilham e exercitam sua autoridade perante estes prisioneiros num espaço exíguo. Esta exiguidade é essencial porque o que importa aqui a Mekas, que estava sozinho no set, trocando de câmera a cada fim de chassi, é este personagem-câmera, é como participar desta ação, que mise-én-scene criar.
Prólogo: ao decidir que faria esta parceria com o Living Theatre, Mekas vai ao teatro para assistir a peça (ela ficou em cartaz durante algum tempo, mas foi tirada de cartaz por suposto anti-patriotismo. A encenação para o filme foi clandestina) e após 8 minutos, segundo ele durante a apresentação do filme, vai embora. No decorrer do filme percebe-se facilmente a principal questão de The Brig: como filmar o controle, como filmar a disciplina e a rigidez levada ao paroxismo? Com um trabalho de câmera que priorize o acaso, que se realize no contato com presente (como todo o trabalho de Mekas). Um refrão do filme é o pedido dos prisioneiros aos guardas para que possam atravessar as linhas brancas que dividem o corredor que envolve a grande cela. Os guardas pedem sempre que eles repitam ad infinitum “ senhor, prisioneiro número ... pede permissão para cruzar a linha, senhor “. O cinema de Mekas é aquele que não é subjugado e nem subjuga. É o cinema interessado no presente, em reagir e interagir com ele, seja o que for.
Se pode surpreender que Mekas tenha escolhido um tipo de encenação que coloca aos nossos olhos cenas de violência e humilhação totalmente atípicas dentro de sua obra, mesmo quando trata da morte ou de qualquer tipo de tema um pouco mais grave, a razão para tal logo se percebe. O jogo que esta encenção propõe deu a Mekas a chance de exercitar a característica que vai definir o eixo principal de sua obra: a capacidade de reagir ao presente, de tornar a câmera um instrumento de contato, de afetação. The Brig é um exercício sobre ser afetado. Toda peça versa sobre isso. Sobre o preso que sucumbe, apanha e vai pra solitário, o outro que tem que aprender os modos do lugar, curiosamente próximo de Tropa de Elite, por exemplo (outa referência é Bom Trabalho de Claire Denis, pela aproximação entre exército e dança). Mas a encenação de Mekas não busca o efeito, nunca se vê a câmera tremer sem um motivo que emane da tela.
Curiosamente a mise-én-scene de Mekas, aliada ao registro crescente em intensidade da interpretação dos atores leva a um interessante misto de distância e envolvimento. Ao mesmo tempo que temos uma câmera misturada ä realidade da encenação, feita initerruptamente, segundo Mekas, as constantes sombras do câmera nos colocam num lugar de intermédio em relação ao filme.
Mesmo jogando fora-de-casa, Jonas Mekas consegue tornar The Brig um interessante exercício de cinema, complexificando a trama entre realismo e artifício já presente na encenação do Living Theatre, respondendo que o que cinema pode fazer contra aquilo é tornar imagem a liberdade de vir e a possibilidade ser afetado, de se misturar ao outro, por fora dos códigos estabelecidos, crinado assim novos espaços, a serem visitados por nóes, espectadores.

7/10

Nenhum comentário: